10 de junho de 2013

Nem a pau


Sempre tive um certo desconforto com entrevistas de comediantes. Não gosto de assistir porque eles não saem nunca da personagem. Estão lá, em qualquer horário, fazendo gracinhas e mostrando o quanto são insuportavelmente engraçados. Compreendo que este é o papel deles. Ninguém vai querer entrevistar um humorista que faça uma profunda avaliação política do país ou que analise os índices de violência. A não ser em tom jocoso.
Tudo bem. O problema é meu. Mas imagino também que exista aquele momento em que a criatura bata o cartão de ponto e se transforme em um cidadão como outro qualquer que precisa ir ao supermercado, levar o filho ao médico, esteja com dor de barriga ou apenas querendo curtir uma festa ou um evento cultural. O certo é que sempre vai aparecer um engraçadinho que o reconheça.
- Você é o cara da tv? Ah, conta uma piada vai.
O ser humano é assim, costuma confundir as coisas e ainda acha que está cheio de razão.
Uma vez fui finalista de um concurso nacional de poesia cuja premiação aconteceu em Salvador. Fiquei na mesma mesa que um cantor baiano muito famoso e ele passou a noite sendo pentelhado por uma criatura que surgiu não sei de onde e queria que o artista cantasse ali, naquele contexto, as músicas mais populares da carreira. Uma saia justa. Embora o cantor tenha se mostrado extremamente paciente e amável, acabou saindo do evento mais cedo que o previsto.
Guardadas as devidas proporções, quando fui repórter de um jornal impresso aqui na minha cidade, passei por coisas muito parecidas. Chegava como eu mesma em uma festa, um show ou coisa que o valha e tinha sempre um conhecido pra dizer:
- Veio fazer reportagem?
- Cadê o repórter fotográfico? 
- O resto da equipe vai chegar, não vai?
Ou para reclamar de alguma reportagem cuja condução não tinha agradado. Ou da linha editorial do jornal.
Não adiantava dizer que eu não estava mais no horário de trabalho e que antes do diploma vinha uma pessoa que estava ali para se divertir e relaxar. Ou que não me cabia falar em nome de qualquer empresa.
Nesses onze anos de blog sempre tentei deixar claro que esta é mesmo uma página pessoal. Assim como o twitter e o Facebook.
Passei por alguns empregos, exerci funções diferentes, mas aposto que quem está comigo desde o início mal sabe qual a atividade que desempenho.
Sempre foi uma questão de escolha. E isso me cabe.
Bato o cartão de ponto e vou ser eu mesma, aquela que posta vídeo de música, fotos de coisas coloridas e fala do neto.
Não abro mão desse direito nem a pau.


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