5 de janeiro de 2013

A mentira

Dona Lourdes era nossa vizinha de parede e fazia o caruru mais badalado do bairro lá no tempo da minha infância. Eu devia ter uns nove anos de idade e tinha passado os últimos doze meses esperando o grande momento.
O dia chegou com aquele cheiro maravilhoso de camarão, castanha e amendoim  tudo misturado com bastante tempero como deve ser. Acontece que na hora de me arrumar para a festa, resolvi  testar a maquiagem de mamãe. Blush, batom, tudo que estava ao alcance da minha sanha de menina querendo ser vaidosa. (Coisa que não emplacou). Então o pessoal começou a bater na porta do banheiro e não havia água que limpasse aquilo do meu rosto.
Sai tentando fazer cara de paisagem no tempo em que essa expressão nem existia ainda. Mas nada, nada nesse mundo escapava de dona Marlene.
- Por que seu rosto está vermelho assim?
- Não sei, mãe.
E ela:
- Nossa! É alergia! 
- Não é não....
- É sim. Não vai comer caruru hoje.
- Como é que é? (olho marejando)
- Quer se sentir mal? Não vai e pronto.
Foi assim que passei a noite inteira sentada na sala da casa de dona Lourdes vendo todo mundo se encher do caruru e do vatapá mais-gostosos-de-Feira-se-Santana sem provar nem um tiquinho.

Às vezes eu acho que devia ter nascido rebelde.